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Pra que vim, porque vim e como vim.

Sobre redescobertas, ressignificações e estar aberta a ouvir o que tenho dentro de mim.


Não conheço de forma aprofundada o que é fluxo de consciência ou confluência entre consciente e inconsciente, mas posso dizer que a experiência relatada a seguir talvez tenha a ver com isso.


Um dia desses sonhei com a palavra Adinkra, não foi um sonho sobre algum acontecimento, foi sobre ter a sensação de que a palavra tinha sido soprada por uma espécie de voz na minha cabeça um pouco antes de acordar. Ao estar mais desperta eu sequer conseguia definir se a palavra existia ou não.


O fato é que fui pesquisar a respeito da tal palavra e descobri que não apenas existe, mas representa todo um sistema de valores e símbolos e quando estava quase atribuindo isso a algum tipo de revelação mística, conversei rapidamente com meu esposo se ele a conhecia e ele foi logo dizendo "claro! é..." e explicou a definição em seguida. Deduzi a partir daí que provavelmente já havia conhecido a palavra mesmo não a reconhecendo naquele momento conscientemente.


O fato é que eu vinha há dias tentando achar uma linha condutora para uma história que estou escrevendo e de repente "lembrar" a palavra se tornou o centro de muitas coisas. Obtive a resposta que permitiria dar continuidade ao que já estava em processo de produção e a influência para outras criações.


Bom, essa redescoberta me levou a pensar em Les Nubians como trilha. (É gente! os defensores da coerência podem ficar tranquilos que esse texto não tem qualquer pretensão de seguir um único assunto - até porque é assim que a minha cabeça e suponho que a da maioria das pessoas funciona, relacionando assuntos diversos nos levando a esse fluxo mental de livre e constantes associações).


Há anos não ouvia o álbum das duas cantoras, o que é absurdo. Pensei comigo mesma! dada a importância que ele tem na minha vida e o quanto o considero magnifíco do ponto de vista artístico.


Dizem que enquanto há vida há possibilidades, por isso já estou reparando esse equívoco. Senta que lá vem história...


Quando eu as ouvi pela primeira vez foi no início dos anos 2000. A palavra Masterpiece nem fazia parte do meu vocabulário, mas agora posso com certeza afirmar isso sobre o álbum das duas irmãs.


Ouvi "Temperature Rising", assistindo ao clipe na extinta MTV. Lembro de sentir algo que posso nomear como empolgação, mas foi algo muito além disso. A música já começa num super astral e com sons atípicos. A marcação acelerada e mais uma série de elementos vieram à tona, não parecia com nada que eu já tivesse ouvido antes.


De repente a música desacelera... inclui outros sons, batidas e pah! Entra outro cantor com uma pegada de rap, Jonh Banzai.


(O que me fez pensar agora se Ed Motta já ouviu Les Nubians antes da sua polêmica declaração).


O lance é que ter conhecido a música pelo clipe tornou a experiência muito mais completa e hipnotizante. Além disso, ela coincidiu com um anseio que eu cultivava há tempos: vivenciar, reconhecer, aproveitar e me inebriar de uma experiência com elementos culturais africanos que não estivessem sendo expostos de forma estereotipada.

Bom, daí para chegar ao álbum "Princesses Nubiennes" lançado antes desse com Temperature Rising levou mais um tempo, precisou que alguns recursos tecnológicos entrassem em cena, pois achar "CDs" delas na época era acesso para poucos, quiçá para mim que mal tinha ido à esquina ainda.


Mesmo que tenha levado cerca de quatro ou cinco anos para esses dias chegarem, aconteceu! e eu estava pronta para me apaixonar por elas.


Depois de ouvir o sociólogo Sérgio Lessa descrever com intensa paixão e respaldo teórico o que há, segundo as pesquisas e linha teórica que o influencia (Lessa é um dos maiores estudiosos e tradutores de Lukács no Brasil), por trás da experiência humana quanto à sensibilidade à arte, eu passei a pensar que a minha está fortemente ligada à música, mas não só. Se está sentado, permaneça que lá vem mais história:


Segundo ele, as nossas experiências ao longo da vida vão moldando isso para mais ou menos sensibilidade, e não se trata aqui de medir o quanto é bom ou ruim, mas sim o que simples experiências como ouvir uma música, estar diante de uma pintura, ver uma apresentação de dança, ler um livro, etc. podem envolver a pessoa a ponto dessa experiência causar um arrepio, provocar um choro, um riso descontrolado e outras emoções. Lessa descreve o que sentiu aos 15 anos depois de se deparar com uma pintura num museu. A questão é que ele nos conta que quanto mais formos sendo privados ou nos privarmos de vivenciar essas experiências, vamos fechando as portas ou conexões que nos levam a essas sensações.


Retomando minha vivência com o álbum Princesses Nubiennes das Les Nubians, a audição desse álbum me transportou para uma imersão sensorial completa, cada aspecto sonoro e visual proposto pelas musicistas é um convite ao deleite e à experimentação sensorial auditiva mais envolvente que eu já provei nessa breve e limitada vida.


Cada peça desse álbum é uma peça perfeitamente construída, um presente.

Outro fator que me deixa ainda mais admirada é a pronúncia do francês nas músicas. Embora eu tenha estudado a língua por quatro anos na faculdade - "Je ne parle français" - estranho muito ao ouvir um francês falar ou cantar. Tenho a sensação que é necessário um esforço muscular muito grande para isso, e essa impressão me causa uma certa agonia auditiva.


Mas não com essa moças. Com elas não sinto isso em nenhuma das músicas. Além do francês, elas também falam inglês e espanhol. Filhas de mãe camaronesa e pai francês, elas transbordam em cada detalhe de suas manifestações artísticas a diversidade de influências e defendem isso abertamente como parte essencial da proposta musical brilhantemente apresentada.


O que também me faz admirá-las ainda mais, pois acredito que o intercâmbio entre várias culturas, guardadas as devidas proporções, é algo que enriquece o espírito, a vida, quem vamos sendo ao longo dela e quem podemos ser desde que estejamos abertos a isso.


Há algo que te cause arrepios de forma gostosa ou a sensação de estar vivo(a)?

Esse texto foi em partes inspirado pelo post de um amigo, Felipe Milano pensador, escritor e psicanalista . Me identifiquei com a descrição que ele faz sobre o sentir, fez com que eu me lembrasse como me sinto quando me permito abrir um pouco os olhos, os ouvidos e a mente.


Segundo Milano estar aberto às inúmeras sensações: nos conectando com as pessoas e os acontecimentos ao nosso redor é viver. E eu vivo assim me arrepiando, ouvindo músicas, tendo conversas, me conectando com pessoas, saboreando comidinhas simples, compartilhando experiêcias, aprendendo muito com todos que me cercam. Propus a mim mesma o dever se estar presente e imergir nas inúmeroas possibilidades de um dia qualquer. Acho que foi para isso que vim.





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Sihrê: tentando organizar os pensamentos






 
 
 

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